Para quem está acompanhando os últimos acontecimentos do BBB21 assim como eu, viu a atitude extremamente e perceptivelmente racista do participante Rodolffo em face de outro participante, o João. O Rodolffo expressou a sua “opinião” em forma de “brincadeira” comparando o cabelo do João ao cabelo de uma fantasia de homem das cavernas.
Coloquei propositalmente as palavras opinião e brincadeira entre aspas porque a opinião sobre a aparência do João ultrapassa o limite de uma mera opinião, da mesma forma que essa comparação em tom de deboche, ofensiva e racista jamais deve ser considerada uma brincadeira. E para os adeptos do “tudo é mimimi” e do “não se pode falar mais nada hoje” não precisam continuar por aqui, pois não compactuo com quem usa como justificativa do tipo é mimimi para o que é injustificável.
Agora vamos ao ponto jurídico da questão.
Que a atitude de Rodolffo foi racista não resta dúvida. Lendo as matérias publicadas, ficou subentendido que o Rodolffo está sendo investigado pelo crime de racismo previsto na Lei nº 7.716/89, um crime de ação penal pública incondicionada, sendo considerado inafiançável e imprescritível, conforme determina a Constituição Federal.
Contudo, eu creio que o Rodolffo está sendo investigado pelo crime de injúria racial, art. 140, §3º do CP, um crime de ação penal pública condicionada à representação. E se de fato for essa questão algo muito grave aconteceu.
E o que isso quer dizer Mari?
Quer dizer primeiramente que ainda existe muita confusão entre o crime de racismo e o crime de injúria racial. Inclusive para advogados, juízes, promotores e polícia.
A injúria preconceituosa traduz-se em “injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, mediante a utilização de elementos referentes à raça, cor, etnia, religião, origem”, e aqui o bem jurídico tutelado é a honra subjetiva da vítima. Já o crime de racismo, tal como consta no art. 20 da Lei 7.716/89, consiste em “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”, e nesse caso os bens jurídicos tutelados são mais amplos e supraindividuais tratando-se da igualdade e respeito étnico.
Em outras palavras, a injúria racial consiste na ofensa da dignidade ou decoro da vítima mediante a utilização daqueles elementos citados anteriormente. A vítima da injúria racial é certa e determinada. O crime de racismo se manifesta pela discriminação através da exclusão, restrição ou preferência; ou preconceito através de uma opinião formada antecipadamente de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (que particularmente eu acho uma expressão bem feia) que resulta no desrespeito do princípio constitucional da igualdade e respeito étnico. Aqui, viola indistintamente uma coletividade de pessoas pela discriminação ou preconceito.
Mas, atenção! O fato de existir uma ofensa dirigida exclusivamente a uma pessoa não se deve automaticamente caracterizar a injúria racial. É necessário analisar as circunstâncias do fato, pois tal ofensa pode caracterizar discriminação ou preconceito.
Retomando o caso em comento, por se tratar, a meu ver, do crime de injúria de racial, SOMENTE o João poderia solicitar a abertura de uma investigação e NÃO a Polícia Civil, nem o Ministério Público, justamente pelo crime de ação penal pública condicionada à representação do ofendido. Sendo o ofendido nesse caso, o João.
E por que a Polícia Civil começou a investigação? Manobra jurídica em decorrência do clamor midiático. A midiatização do processual penal em favor da pressão popular é uma ofensa gravíssima a Constituição e ao Código de Processo Penal e ocorre diariamente, o que acarreta exageradamente um maior rigor penal, mais repressão, leis penais mais duras, sentenças mais severas e execução penal sem benefícios.
O bom e justo combate ocorre quando respeitadas todas as garantias constitucionais e processuais penais, mesmo quando se trata de algo absolutamente reprovável e inaceitável. Não estou aqui concordando e muito menos justificando nada em relação a atitude do Rodolffo, apenas tratando de esclarecer uma questão processual penal.
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