Um iter criminis digno de um filme ou até mesmo de uma novela.
Em outubro de 2002 um crime parou o Brasil. Ocorrido em uma mansão do Brooklin, em São Paulo, o assassinato de Manfred Albert e Marísia von Richthofen parecia assustador.
As pessoas que acompanhavam o caso na época, contudo, ficaram ainda mais horrorizadas quando descobriram que a própria filha do casal, Suzane, teria sido a mandante do crime brutal, cometido pelos irmãos Daniel e Cristian Cravinhos.
Suzane era namorada de Daniel, porém os pais da garota não aprovavam a relação. Não se sabe exatamente se esse foi o principal motivo que levou Suzane a orquestrar o assassinato de seus pais, já que a história é repleta de fingimentos, mentiras e versões distintas.
No dia 31 de outubro, Manfred e Marísia von Richthofen, foram atingidos com diversos golpes na cabeça por dois agressores, Daniel e Cristian Cravinhos. A perícia não soube informar quantos golpes foram desferidos. Marísia tentou se defender com a mão direita e seus dedos foram quebrados com as pauladas. Foram encontrados no local pedaços de massa encefálica. Manfred tinha uma toalha cobrindo o rosto. Marísia estava com a sua cabeça coberta por um saco plástico preto.
O rosto coberto do casal já indicava que o assassino conhecia as vítimas, pois esse é o tipo de cuidado que um desconhecido não se preocupa em ter.
Os três tentaram planejar um crime perfeito e resolveram simular um latrocínio. E por tentarem cometer um crime perfeito deixaram todos os resquícios de uma cena do crime desorganizada, como a impulsividade que estava sempre presente.
Esqueceram que não existe crime perfeito. A cena do crime fala, e muito!
Após verificarem que ambos estavam mortos, os agressores reviraram o quarto do casal e colocaram uma arma, calibre 38, de propriedade do pai de Suzane, ao lado do corpo de Manfred. No momento em que os agressores praticavam os golpes, não se tem certeza da posição de Suzane na casa, mas possivelmente estivesse aguardando o trágico desfecho no andar debaixo. Por outro lado, as investigações apuraram que Suzane estava junto com os irmãos Cravinhos no momento em que colocaram a toalha na boca de Marísia. Além disso, ela forneceu sacos plásticos para que os agressores depositassem as roupas e as barras de ferro usadas no crime para que pudessem descartar o material que nunca foi encontrado.
Como parte do plano, Suzane, utilizando uma faca, abriu uma maleta de seu pai, na qual sabia se encontrar dinheiro, e pegou cerca de oito mil reais, seis mil euros e cinco mil dólares, além de algumas joias pertencentes ao casal, em uma vã tentativa de forjar um latrocínio, rapidamente descartado pelos investigadores. Tal quantia foi entregue a Cristian, como pagamento pela sua participação.
Após a execução, o casal de namorados passou para a última fase do plano: produzir um álibi. Após saírem da mansão e deixarem Cristian no apartamento onde morava, Suzane e Daniel foram para um motel na zona sul de São Paulo. Por lá, solicitaram a suíte presidencial, pagando o valor de R$ 300,00, sendo que Daniel solicitou uma nota fiscal da quantia. A intenção de criar um álibi impediu o casal de constatar o quão não usual era a conduta de solicitar nota fiscal para quartos de motéis. Essa desastrada medida somente ressaltou as suspeitas já existentes.
Cerca de 03h da manhã, o casal deixa o motel e busca o irmão de Suzane na lan house. Ao pegar o irmão Andreas, os três foram até a casa de Daniel e por volta de 04h da manhã Suzane e Andreas voltaram para casa.
Quando chegaram na mansão, Suzane teria estranhado o fato das portas estarem abertas. Andreas teria entrado na biblioteca da casa e gritado para os pais. Nisso, depois de ligar para Daniel, Suzane se juntou ao seu irmão. Daniel chegou e ligou para a polícia.
O policial militar Alexandre Boto foi o policial que atendeu a ocorrência naquela noite. Quando um crime bárbaro como esse acontece, familiares passam mal, entram em choque, choram, gritam, mas, neste caso nada disso aconteceu. A primeira situação que chamou a atenção do policial foi que Suzane perguntou “como estão meus pais?”, porém estranhou a pergunta, porque em nenhum momento a menina havia dito que seus pais estavam em casa.
Daniel e Suzane sempre perguntavam pela quantia de dinheiro roubada. Mas, como eles sabiam?
Depois, quando Suzane e Andreas tomaram conhecimento do falecimento dos seus pais não houve nenhum grito, nenhuma lágrima, nenhuma tentativa de entrar em casa. E aí, outra pergunta foi feita por Suzane ao policial. Desta vez uma pergunta de ordem prática que pessoas em choque são incapazes de fazer, isso porque estão sem qualquer capacidade de raciocínio prático.
“E o que é que a gente faz agora?”
Essa pergunta também chamou a atenção do policial.
Daniel, Suzane e Andreas continuaram conversando normalmente sobre os próximos passos, o que fazer e o que não fazer, para onde ir. Pareciam pessoas normais diante de um problema corriqueiro.
O policial militar achou tudo muito confuso e fora do padrão. Como Suzane e Daniel sabiam da quantia em dinheiro que foi roubada se ela disse não ter entrado em casa?
E o Andreas?
Bom, ele é um caso a parte.
Assim como Suzane e Daniel, Andreas seria ouvido pela polícia. Andreas não parecia assustado e comportou-se como adulto, depondo de forma controlada e concentrado em tudo o que acontecia ao seu redor. Delegado e investigador ao ler o depoimento do garoto perceberam várias lacunas na história contada por Andreas. O irmão de Suzane falava o mínimo necessário, como se estivesse omitindo algum fato.
Andreas chegou a pedir ao delegado para ver as fotos dos pais, e obviamente não foi autorizado que ele tivesse contato com essas fotos. “Por quê? Eu quero ver!”, disse o garoto.
No final do depoimento, o delegado insistiu para que Andreas comesse um lanche do McDonald’s, afinal já eram 22h do dia seguinte.
“Você quer um lanche do McDonald’s?”
“Quero só sorvete.”
“Tua mãe acabou de morrer e você quer tomar sorvete?”
“É, só um sorvete.”
Nunca houve nenhuma prova de seu envolvimento no assassinato de seus pais. A dúvida é se Andreas sabia de alguma coisa, mesmo que parcialmente. Teria ficado com medo de ser uma das vítimas e por isso se manteve em silencio? Sabia de todo o plano macabro ou apenas desconfiou que algo aconteceria naquela noite?
Suzane é psicopata? Para os profissionais da área tudo indica que sim. Contudo, através das minhas leituras parece que ainda não tem um diagnóstico certo.
Porém, uma característica do crime remete a psicopatia. O parricídio. Parricídio é matar ascendentes. Os parricídios costumam com frequência acontecer perto de datas festivas para a vítima ou para o parricida. Suzane faz aniversário dia 03 de novembro e o crime aconteceu dia 31 de outubro.
Desde o começo das investigações, a hipótese de latrocínio foi vista com muita desconfiança. Isso porque no local do crime muitos elementos chamaram atenção dos investigadores, como:
- o fato de apenas o quarto do casal estar bagunçado;
- algumas joias terem sido deixadas no local;
- a arma da vítima não ter sido levada;
Em busca de respostas, a polícia começou a investigar as pessoas mais próximas da família: filhos, empregados, colegas de trabalho. Não tardou a vir a tona a informação de que o relacionamento de Suzane e Daniel não era aceito pela família von Richthofen. A partir daí a investigação passou a considerar Suzane e Daniel como os principais suspeitos.
No decorrer das investigações, aportou à autoridade policial um elemento inesperado, qual seja, a informação de que Cristian Cravinhos, irmão de Daniel, teria realizado a aquisição de uma motocicleta e realizado o pagamento em notas de dólares. Intimado para prestar esclarecimentos, Cristian foi ouvido, simultaneamente, mas em ambientes separados, com Daniel e Suzane. Cristian não resistiu à pressão e foi o primeiro a sucumbir, tendo confessado o delito: “eu sabia que a casa ia cair”. Em seguida, Daniel e Suzane também sucumbiram.
O julgamento de Suzane von Richthofen e dos irmãos Cristian e Daniel Cravinhos durou mais de 65 horas. A sessão começou no dia 17 de julho e foi encerrada às 2h10 da madrugada do dia 22 de julho.
Suzane foi condenada à pena de 39 anos de reclusão e 06 meses de detenção; Daniel foi condenado à pena de 39 anos de reclusão e 06 meses de detenção; Cristian foi condenado à pena de 38 anos de reclusão e 06 meses de detenção.
Gostou desse texto? Curta e compartilhe!
Ficou alguma dúvida? Coloque nos comentários e vou ficar feliz em responder!
Se for citá-lo em algum trabalho, não esqueça de mencionar-me!
_____________________
Fonte:
Livro “O Quinto Mandamento” da Ilana Casoy
Artigo “Caso Richthofen” publicado no Canal Ciências Criminais e escrito por Cezar de Lima e Felipe Faoro Bertoni
Sentença na íntegra: https://www.conjur.com.br/2006-jul-22/suzane_daniel_pegam_39_anos_seis_meses_prisao?pagina=3